A discussão entre os gregos antigos girava em torno da cosmologia, [1] era necessário produzir doutrinas práticas que orientassem o viver bem. Este viver bem era alcançado através da virtude e da harmonia em atitudes diárias com o próximo e com a natureza.
A harmonia com a natureza, não se resumia apenas a uma questão ecológica, mais a uma questão moral, pois eles acreditavam que existia uma lei moral no mundo, esta lei permitia ao homem viver e se realizar como ser humano racional, ou seja, viver de acordo com a sua natureza.
Destarte, a lei moral seria um aspecto da lei natural. As religiões antigas, assim como a religião grega era bastante naturalista, para estes povos os deuses eram personificações das forças naturais. Portanto, ser ético ou moral era viver e agir de forma a satisfazer os deuses, tais como: o raio, a força, a chuva, a terra, etc.
A religião judaica vem trazer uma mudança significativa nesta forma de compreender o mundo e se relacionar. Diferente da concepção grega, o Deus de Abraão, Isaac e Jacó, não se identifica com as forças da natureza, pois ele é um Deus Transcendente, estando acima de tudo o que há de natural.
Esta compreensão de um único Deus superior as forças naturais, traz uma mudança profunda em termos éticos e morais. De acordo com (VALLS, 1994, p.36).
Em termos éticos ou morais, isto tem uma consequência profunda: quando o homem se pergunta como deve agir, não pode mais satisfazer-se com a resposta que manda agir de acordo com a natureza, mas deve adotar uma nova posição que manda agir de acordo com a vontade do Deus pessoal.
Para agir de acordo com a vontade de Deus, se faz necessário conhecer a Deus e a sua vontade. Sendo Deus grande em misericórdia não deixou a humanidade sem este conhecimento, antes se revelou, de forma que todos possam conhecê-lo e se relacionar com ele de forma pessoal e amorosa.
Como seres humanos finitos, não poderíamos por nos mesmos conhecer a Deus que é infinito e transcendente, a não ser que Ele se revelasse a nós. Por seu infinito amor, Deus tornou possível o conhecimento da sua vontade para a humanidade. A princípio por meio de suas obras, isto é, a criação.
Os céus proclamam a glória de Deus; e o firmamento anuncia as obras de suas mãos. Um dia faz declaração a outro dia, e uma noite mostra sabedoria a outra noite. Sem linguagem, sem fala, ouvem-se as suas vozes, em toda a extensão da terra, e as suas palavras até ao fim do mundo (BÍBLIA, Salmos 19. 1-4).
Porém, na Palavra de Deus temos uma revelação muito maior e especial, sendo dupla esta revelação:
Ø A Bíblia – a palavra escrita,
Ø Cristo – a palavra viva (Jo 1.1).
Devido à queda do homem esta dupla revelação se tornou necessária. “A revelação especial era necessária porque a raça humana havia perdido o relacionamento de favor que, antes da queda, tinham com Deus” (ERICKSON, 2008, p.56).
Diferente então dos filósofos gregos, os hebreus, não partiram em busca do viver bem, como o objetivo final da existência humana. Os descendentes do patriarca Abraão, e herdeiros da aliança divina, procuravam viver e agir pautados no conhecimento de Deus e em suas instruções.
Estas instruções foram dadas por Deus ao seu povo, por intermédio de seu servo Moisés no Sinai, no decálogo encontramos as orientações para o viver diário, bem como para o relacionamento com Deus.
A revelação de Deus é voltada para a educação e o aperfeiçoamento do homem, diante disto podemos dizer que Ele é um Deus pedagógico, buscando no caminhar diário, ensinar e conduzir seus filhos a uma vida de plenitude, tanto terrena como eterna.
Na Bíblia encontram-se as orientações para uma vida de fé e de prática, a ortodoxia[2] e a ortopraxia[3] não se exclui, mas juntas representam a revelação de Deus para a humanidade.
Diante deste contexto podemos perceber a diferença basilar entre a ética filosófica e a ética cristã. Embora as duas se preocupem com assuntos morais, a metodologia utilizada pela visão filosófica é quase oposta a da ética cristã.
ÉTICA FILOSÓFICA E ÉTICA CRISTÃ
A ética filosófica busca a verdade e o bem pela razão, conforme os conceitos da época, por isto é mutável e relativa. Ela é descritiva e subjetiva.
A ética cristã não busca a verdade e o bem primeiramente pela razão, ela não exclui a razão, mas a leva cativa à obediência de Cristo. Ela é imutável e absoluta, com caráter objetivo e normativo.
ÉTICA FILOSÓFICA
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ÉTICA CRISTÃ
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Ciência dos costumes e hábitos
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Revelação da vontade divina
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Descritiva
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Normativa
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Relativa
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Absoluta
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Imanente
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Transcendente
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Situacionista
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Direcionista
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Subjetiva
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Objetiva
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Mutável
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Imutável
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Quadro 1 – Fonte: REIFLER (2009. p.16).
A ética cristã vai além dos costumes, comportamentos ou atitudes, ela direciona o homem para viver de acordo com a vontade de Deus, e mostra o bem e o mal de acordo com o que está revelado nas Sagradas Escrituras. Contudo ela não é apenas lei, ou norma, ela é vida e evangelho. Sua abordagem parte de uma visão teológica, cristã e evangélica.
Ø Visão Teológica: Para se viver uma ética cristã é imprescindível conhecer a Deus. Todo o estudo do comportamento moral da humanidade parte e é determinado pelo conhecimento de Deus e de sua revelação registrada nas Sagradas Escrituras. É uma ética teocêntrica, e não antropocêntrica, isto é, o centro é Deus, não o homem.
Ø Visão Cristã: Cristo é o centro, e o exemplo da ética cristã. Ela só é cristã, pois é condicionada a Cristo. Para se viver uma ética cristã, é preciso seguir os ensinamentos de Cristo, revelados nas Sagradas Escrituras.
Ø Visão Evangélica: A ética cristã é evangélica, pois parte da reflexão do evangelho, ou seja, das boas novas encontradas na Palavra de Deus, estas boas novas são encontradas tanto no preâmbulo do decálogo como nas boas novas que Jesus Cristo pregou e viveu.
A ética cristã tem seu alicerce no conhecimento de Deus, por isso antes da ortopraxia é preciso conhecer a ortodoxia, pois é o conhecimento da verdade que leva o homem através da atuação do Espírito Santo, a uma ação correta. “O ser e o fazer estão implícitos no crer, bem como o verdadeiro crer influencia o ser e resulta no fazer” (REIFLER, 2009, p.32).
A estrutura basilar da ética cristã está em se conhecer a Deus e a sua vontade.
[1] Estudo filosófico do mundo.
[2] Ortodoxia – conjunto de doutrinas provindas da Bíblia, e tidas como verdadeiras de conformidade com os credos, concílios e convenções da igreja.
[3] Ortopraxia – Pureza da prática cristã – o agir correto.
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